2006/04/30

A Bicicleta - Tributo à Fâni


Eu e meus 11 anos. Um passeio ciclístico, alguns prêmios pela participação e o meu cupom foi o sorteado para a bicicleta, prêmio principal. Foi das maiores emoções! 286... acho que era esse o número do meu cupom. Exigiram minha subida àquele palanque armado e de lá posei para fotos ao lado do meu prêmio.
Hoje, com os meus dezessete anos, ainda possuo o prêmio, mas já não tenho tanto gosto por ele.
Reconheço a sua utilidade, mas talvez por não ser a única bicicleta em minhas mãos, essa utilidade é de uma porção menor. Fiz muito uso dela, verde e conservada, mas por motivos maiores, não me incomodo em dela desfazer-me; tenho ainda a "Jennifer-Green", essa, presente de papai, o que pode suprir minhas necessidades ciclísticas.
Tentei por vezes algum anúncio, pessoas que se interessasssem em comprá-la. Algumas ofertas, mas nada...
Andava eu então, pela avenida da cidade, em pleno sol do meio-dia, devido a algumas obrigações. Logo, por uma via lateral, encontrei com o Pedro, o pai da Fãni, que andava com um colega:
-Oi Pedro, tudo bem?
-Oi!
Continuei a andar, ele me acompanhou:
- E você, tá fazendo o cursinho na faculdade?
-Não, minha irmã é quem está fazendo cursinho...
-Ah, a Fâni hoje foi pra faculdade ás 8 horas. Ela levantou e disse: "nossa pai!, eu preciso fazer boa prova hoje, senão vou ficar 'ralando' até o fim do ano" e foi fazer prova hoje... ah, mas a Fâni é esperta e fará boa prova!
-Vai sim!
-Eu tenho o maior orgulho da minha filha, que é uma musa pra mim... E agora está na faculdade!
E teve um dia que nem te conto: eu tinha mania de acordar e ir fazendo um lanche pra ela, aí eu acordei cedinho e vi a porta do quarto dela fechada, mas eu respeito muito a privacidade dela e nem abro a porta do quarto, você sabe como é lá em casa, aí, eu fui pra cozinha, fiz o chocolate dela... A Norma viu e falou: "Ô Pedro, pra que isso?", eu: "Pra minha filhota!", "ah, mas a Fâni só vem na sexta que vem...". Eu nem acreditei! Fui no quarto dela e só vi os seus bichinhos de pelúcia... Tinha feito o sanduíche com todo o carinho pra ela e acabou que eu mesmo o comi, e com raiva!
Agora o Pedro lembrava dos anos da minha amizade com a Fâni, das outras meninas e lembrou-se que vira a Aline, fazendo aula de direção:
-Ela tirou carteira? A Fâni já passou na Legislação! Eu falei com a Fâni que ela está meio precoce, fazendo tudo de uma vez, mas ela já me disse que assim que conseguir carteira, quer que eu compre um carro pra nós.
Minha filha é linda, né?! Outro dia eu fiquei triste porque ela cortou as pontas do cabelo e o cabelo dela é maravilhoso!...
Nem se eu quisesse, me arriscaria em contrariá-lo, sendo o pai coruja que confessava:
-É... é sim. Gosto muito da Fâni, ela é boa gente.
-Ela é! Minha filha pode ser um pouco ignorante, mas ela é maravilhosa...
-É... a Fâni é meio esquentada!
-Outro dia - dizia ele - eu virei pra ela e falei assim: "é, Fâni... você está com uns pneuzinhos, hein?!" e não foi que ela ficou com raiva? Disse que aquilo não era brincadeira de gosto e durante uma semana não conversou comigo.
Ontem, eu cheguei e vi ela no sofá, com um lenço, aí eu cheguei e enchi, enchi ela de beijos. Ela fala que não gosta, fala que eu tô com cheiro de bebida, mas eu sei que ela gosta de que eu faça isso!
O que eu não gostei muito, foi dessa idéia dela mudar... mas já que ela preferiu assim, eu confio nela, mesmo ela estando naquela cidade grande e perigosa...
Pelo horário, imaginei que o Pedro estaria indo trabalhar e pensei que talvez ele pudesse conhecer alguém que quisesse comprar uma bicicleta. Ofereci:
-Ô Pedro, você mexe com bicicleta, não mexe?
-Mexo sim.
-É porque eu quero vender a minha, que está em bom estado e eu não cobro caro não!
-Ah, tá. Então eu compro na sua mão. Você quer quanto nela?
-Sério? Você compra? Então faz assim: eu a trago e você avalia, aí se você concordar com o meu preço, será este.
-Não, que isso! Não preciso avaliar não!
Combinamos um preço, compensador pra ele e supridor de um plano, pra mim.
-Vou dá-la pra Fâni, porque eu perdi a dela!
Sabe, eu amo demais os meus filhos... o Wesley tem as doideras dele, mas ele tem seus princípios! (realmente). Tanto, continuava, que esses dias ele tá meio sozinho, aí eu falei com ele que iremos lá pro Recife, mas sem a Norma, só eu e ele, pra ele conhecer outras coisas da vida...
-Você já foi no Recife? - perguntei.
-Ih!... Recife, Canadá, Alemanha... já trabalhei em muitos lugares, até mesmo por isso, eu coneço muito do submundo! Eu falo são cinco idiomas!, por causa do tempo que eu viajava...
-Nossa, que legal!
-E as experiências que eu tive, eu passo pra eles... sabe, vou te falar: eu não posso dar muita coisa pra Fâni não, mas o pouco que eu tenho, eu darei. Eu tenho alguns dólares e hoje a Fâni me falou assim: "ô pai, depois que eu formar eu quero fazer bacharelado nos Estados Unidos"; e sabe o que eu farei com esses dólares? Vou fazer a vontade da minha filha, se ela quiser ir... o carro eu deixo pra lá.
Eu acho que Deus colocou meus filhos na minha vida como um presente pra mim, porque eu os amo muito!
-Ah, foi sim! -concordei- Um presente tanto pra você quanto pra eles, de ter um pai assim...
-É... hoje a Fâni estava saindo de casa e eu falei com ela: "(...)" -nesse momento, ele disse algumas palavras em alemão-, aí ela falou assim: "ih, pai! Fala português porque o senhor sabe que eu não entendo essa língua", mas eu estava dizendo que eu oro uito por ela, que é o que eu sempre poderei fazer.
Logo, por uma rotatória, nossos caminhos se desencontrariam, daí nos despedimos:
-Quando a Fâni estiver, vai lá depois!
-Vou sim... e está de pé a bicicleta?
-Está sim. Pode trazê-la! Tchau!
-Tchau!
Fâni, a nossa "Fera" ou "Fanfarra", se resume em pessoalidade das mais singulares que eu conheço. E creio que não só em mim, mas em todos que com ela convivem, ela desperta grande admiração e estima.
Segui ainda pelo sol do meio-dia e levei comigo uma percepção desse meu encontro com o pai de Fâni, onde reafirmei a crença de que, quando realmente se quer algo, o Universo conspira a nosso favor, daí quando "damos por nós", vemos que estamos no lugar e na hora certa, ou sabe-se lá quando (com direito a rima) eu venderia a minha bicicleta!

(novembro de 2003)

Horizonte


Olhe para o horizonte.
Ele acalma, revitaliza as esperanças e confirma em
cores
rosa e azul
a existência de um ser grandioso e criador.

Olhe para o horizonte.
Ele faz-nos perceber que mais um dia na vida foi-se
e que em
cores
dourada e preta
a noite vem com seus rumores
talvez trazer amores.

Olhe para o horizonte.
Sinta e veja a beleza que o horizonte é.
Ele em espetáculo mostra-nos o quão rápido a vida está indo.
Ele espetáculo de nem um minuto
mostra que podemos ter
cores.

Mostra que podemos sobreviver
e como ele, estar ali, todos os dias,
apesar de tantos detalhes,
apesar de tantos espinhos em meio as flores.

Junção

Junção de palavras.
Palavras: junção de letras.
Letras: junção de traços, círculos, rabiscos...

Confluência, juntura, as juntas que unem membros
inferiores e superiores.

Juntos
em idéia
em corpos, em alma
junto, e não sozinho.

O azul e rosa de um crepúsculo - nunca seria
se fosse só azul.

A junção é importante.
A junção é.
Junção porque nada vive sozinho, tudo se ajunta de alguma forma.
Essa cadeira, esse computador, os meus neurônios.

Aqui é a de palavras.